VERBOS NOVOS E HORRÍVEIS
Não,
por favor, nem tente me disponibilizar
alguma coisa, que eu não quero. Não aceito nada que pessoas, empresas ou
organizações me disponibilizem. É uma questão de princípios. Se você me oferecer, me der, me vender, me emprestar, talvez eu venha a topar. Até
mesmo se você tornar disponível, quem sabe, eu aceite. Mas, se você insistir em
disponibilizar, nada feito.
Caso
você esteja contando comigo para operacionalizar
algo, vou dizendo desde já: pode ir tirando seu cavalinho da chuva. Eu não
operacionalizo nada para ninguém e nem compactuo com quem operacionalize. Se
você quiser, eu monto, eu realizo, eu aplico, eu ponho em operação.
Se você pedir com
jeitinho, eu até implemento, mas operacionalizar, jamais.
O
quê? Você quer que eu agilize isso
para você? Lamento, mas eu não sei agilizar nada. Nunca agilizei. Está lá no
meu currículo: faço tudo, menos agilizar. Precisando, eu apresso, eu priorizo, eu
ponho na frente, eu “dou um gás”. Mas agilizar, desculpe,
não posso, acho que matei essa aula.
Outro
dia mesmo queriam reinicializar meu
computador. Só por cima do meu cadáver virtual. Prefiro comprar um computador
novo a reinicializar o antigo. Até porque eu desconfio que o problema não seja
assim tão grave. Em vez de reinicializar, talvez seja o caso de simplesmente reiniciar, e pronto.
Por
falar nisso, é bom que você saiba que eu parei de utilizar. Assim, sem mais nem menos. Eu sei, é uma atitude um tanto
radical da minha parte, mas eu não utilizo mais nada. Tenho consciência de que
a cada dia que passa mais e mais pessoas estão utilizando, mas eu parei. Não
utilizo mais Agora só uso. E recomendo. Se você soubesse como é mais
elegante, também deixaria de utilizar e passaria a usar.
Sim,
estou me associando à campanha nacional contra os verbos que acabam em
"ilizar". Se nada for feito, daqui a pouco eles serão mais numerosos
do que os terminados simplesmente em "ar".
Todos
os dias, os maus tradutores de livros de marketing e administração disponibilizam
mais e mais termos infelizes, que imediatamente são operacionalizados pela
mídia, reinicializando palavras que já existiam e eram perfeitamente claras e
eufônicas.
A
doença está tão disseminada que muitos verbos honestos, com currículo de ótimos
serviços prestados, estão a ponto de cair em desgraça entre pessoas de ouvidos
sensíveis. Depois que você fica alérgico a disponibilizar, como vai admitir,
digamos, "viabilizar"? É triste demorar tanto tempo para a gente se
dar conta de que "desincompatibilizar" sempre foi um palavrão.
Precisamos
reparabilizar nessas palavras que o pessoal inventabiliza só para
complicabilizar. Caso contrário, daqui a pouco nossos filhos vão pensabilizar
que o certo é ficar se expressabilizando dessa maneira. Já posso até ouvir as
reclamações: "Você não vai me impedibilizar de falabilizar do jeito que eu
bem quilibiliser". Problema seu.
Me inclua fora dessa.
(Ricardo Freire)